14-11-2009
por: Alfredo Nunes
fotos: Arquivo pessoal
Florianopólis-SC
A primeira vez que vi um skate foi em 1974 em Sorocaba – SP. Achei o máximo e fui perguntar ao garoto que andava no brinquedo o que era aquilo e ele me respondeu isso é um skateboard. Naquele momento eu decidi que queria tentar a brincadeira. Poucos meses depois minha família se mudou para Natal. Alguns meses depois eu fui passar uns dias na casa de um amigo do meu pai em Fortaleza. Ele tinha um filho da minha idade. Grande amigo até hoje. Quando cheguei a sua casa vi um par de patins na garagem e fui logo falando pra ele sobre minha recente descoberta em São Paulo e disse que com aquele par de patins poderíamos fazer dois skateboards. Com ajuda de seu pai arrumamos duas tábuas e partimos para a montagem dos carrinhos. Esse foi meu o primeiro contato direto com um skateboard.
Alfredo(Direita) com Claudio Sérgio, no quintal de casa no bairro de Lagoa Sêca em Natal.
Depois passei pelo Bandeirante, pelo Torlay, tive um bananinha importado com shape de fibra de vidro, que acabei esquecendo num taxi no Rio de Janeiro. Depois tive um RK com eixo Bennet Pro, com o qual comecei a me arriscar numa rampa construída com uma única folha de compensado naval na garagem da minha casa, tentando imitar as monobras que via na revista Skateboard. Isso já foi no final da década de 70, quando começaram a asfaltar uma série de avenidas em Natal e era nesses locais que uma turma se juntava com seus carrinhos. Entre eles estavam os irmãos Albano (Tercílio e Joselito) que chegavam numa Kombi trazendo uma rampa parecida com a que eu tinha em casa, só que muito mais bem feita, Ilzeli Confessor, recém chegado de Teresina, entre outros como o finado Juarez e Paulo Negão. Era uma galera!!
Os pontos principais eram as avenidas Prudente de Morais, na Ladeira do quartel da polícia, em Candelária, a Av. Nascimento de Casto, a via Costeira, que começou a ser asfaltada a partir de Ponta Negra e o ladeirão do Centro de Convenções ainda sem tráfego era um paraíso para os skatistas da época, ou seja, em qualquer ponto por onde passava o chão preto novinho, lisinho e ainda sem muito trânsito. Nessa época consegui comprar meu primeiro old school com um shape 30″ X 10″,eixos de 169 mm, que eu nem me lembro a marca e rodas DM (duas azuis e duas amarelas).
FS Grind no quintal de casa
Logo começaram viagens para João Pessoa onde descobrimos a pista podre que foi meu primeiro contato com a onda de concreto. Lá montávamos as barracas ao lado da pista e as sessions eram intermináveis acontecendo desde o início da manhã até tarde da noite, quando o local era invadido por viciados, pederastas, travestis e outros bichos da fauna do submundo e nós nos recolhíamos para o merecido descanso, que algumas vezes era interrompido um desses espécimes raros. Lembro uma vez que eu e Tercílio montamos a barraca numa valeta e durante um temporal de madrugada acordamos como se estivéssemos dormindo em um colchão de água Tivemos que sair na chuva pra mudar a barraca de local antes que fossemos levados pela enxurrada.
Galera em João Pessoa-PB, em uma da incontavéis viagens.
Lembro bem que nessa época tínhamos que nos virar e ter criatividade para encontrar os picos. Lembro que durante um período ficaram armazenados na zona portuária de Natal uns tubos de aço com uns 4 metros de diâmetro que fizeram a festa da galera. Foram várias sessions tentando imitar os gringos que vimos em um dos números da revista Skateboard andando em mega tubos de concreto no deserto da Califórnia.
Sempre viajava para São Paulo e Rio de Janeiro para visitar parentes e o carrinho sempre tiracolo em uma sacola feita pela minha mãe com um resto de tecido de uma calça jeans velha. Nessas viagens tive oportunidade de andar em várias pistas como Franete e Wave Park, um snake com um bowl no final que tinha no zoológico de Jundaí. Também Nova Iguaçu e Campo Grande no Rio de Janeiro.
50-50
Nessa época surgiu o Flying Rollers no Aero Clube, onde havia apenas um quarter pipe onde rolavam as sessions de skate, quando a galera dos patins já não dominava a cena, numa faze entre o final da moda dos patins e a construção do bowl. Infelizmente quando o bowl foi construído eu já tinha começado meu curso de geologia na UFRN e decidi me dedicar integralmente aos estudos, foi quando anunciei meu skate para venda e rapidinho vendi. Vendo as entrevistas do VeteranSkate tenho a impressão de que, quem comprou meu skate foi o Jameson Moleza, que naquela época era iniciante. Ainda cheguei a participar de um campeonato no bowl, acho que o primeiro que aconteceu lá, mas na posição de juiz.
Afastei-me do skate por exatos vinte anos, de 1982 até 2002. Mas a minha paixão pelo carrinho nunca acabou. Quando via campeonatos na televisão ficava empolgado. Quando era half pipe, ficava na cadeira fazendo impulso acompanhando as manobras que evoluíam espantosamente. Sempre acompanhava a evolução do brinquedo que virou esporte, ganhando respeito da população e dos meios de comunicação em geral. Lembro-me que comentávamos que o programa Globo Esporte só noticiava futebol e que provavelmente nunca veríamos notícias de skate naquele programa. Hoje a primeira imagem que aparece na abertura do programa é de skate. Lembro-me também de um dia na ladeira da Via Costeira no final de uma session conversando com Ilzeli e Tercílio eu dizia que andaria de skate até quando conseguisse ficar em pé, o que todos concordavam comigo e isso me deixava triste por ter abandonado o esporte. Sempre que eu tinha uma chance nas minhas viagens pelo Brasil, já exercendo a profissão de geólogo, quando encontrava a garotada brincando com seus skates pedia para dar uma voltinha, o que geralmente punha a garotada espantada e ouvia os seus comentários. Olha o tio ali sabe andar de skate! Isso me deixava orgulhoso e com vontade de voltar a andar de skate, até que, em 2002, quando morava em Carajás no Sul do Pará, onde morei por sete anos, trabalhando para a então Companhia Vale do Rio Doce, um dia no escritório, no final da tarde, vi dois colegas, um geólogo recém formado e um técnico de geologia que é de Natal, ambos com vinte e poucos anos de idade, cochichando combinando algo para fazer depois do trabalho. Foi quando perguntei aos dois, o que eles cochichavam e eles, meio sem graça, me responderam que estavam planejando ir andar de skate em um half pipe que tem no clube da vila construída pela Vale. Aí eu disse que iria também. Os dois me olharam meio desconfiados, pois naquela época eu estava com 39 anos e nunca tinha comentado com eles sobre minha experiência anterior com skate. Quando cheguei ao clube os dois já estavam lá e eu fiquei assistindo enquanto me alongava. Logo um deles me emprestou seu skate e eu caí no half mostrando um pouco do que eu ainda sabia fazer e os dois ficaram espantados com o que viram. Não que eu tivesse mandado ver, mas é que eles não esperavam ver o coroa brincando no carrinho. E olha que um deles depois me confidenciou dizendo que eu tinha mandado bem até melhor que o outro colega.
R’Roll
Alguns meses depois fiz uma viagem para Florianópolis para visitar meus pais e comprei um skate. Montei um na primeira loja que entrei. Comprei um shape Maha, um par de trucks Crail 136 mm, rodas Moska bowl 59mm, rolamentos Abec e saí em busca dos picos daquela cidade. Comecei pela recém construída pista do Kobrasol, que tem um banks gigante, quarter, funbox, escadas com corrimão e rampa de 45°, além de duas miniramps, toda em granilite. Desse dia em diante nunca mais parei, ou melhor, em junho de 2004 sofri um grave acidente no half pipe do clube em Carajás, onde redescobri o skate e quebrei o braço direito, com uma fratura grave. Esse acidente me tirou da atividade por um tempo. Passei por duas cirurgias uma para colocação de fios de platina e outra para a retirada dos fios. Nesse período eu sonhava andando de skate enquanto dormia e pensava: Não é isso que vai me fazer desistir. Fiz fisioterapia e alguns meses depois estava de volta. Hoje costumo carregar meu carrinho aonde vou.
Hoje estou morando em Macapá, capital do Amapá, uma cidade com 380 mil habitantes e sou gerente de geologia de uma empresa multinacional canadense de mineração. Macapá me lembra Natal da década de setenta. Tem uma pista bem simples no bairro Santa Inês, na margem do rio Amazonas, que tem miniramp, funbox, com corrimão, quarter pipe e rampa de 45°, que nos fins de semana é literalmente invadida por uma legião de skatistas, inliners e ciclistas formando um crowd difícil de participar. Às vezes vou de manhã cedo quando não tem ninguém, pois no fim de tarde, quando o sol aqui no equador é mais ameno, mas fica impossível pro coroa disputar com a garotada (Macapá tem algumas particularidades: é a única capital brasileira banhada pelo rio Amazonas e localizada na linha do equador. A minha casa, por exemplo, fica do outro lado do equador, ou seja, no hemisfério Norte).
Eu também tenho um long board com shape Perfect Line 43”, truck Crail Old School Silver Downhill 160mm, rodas Kryptonics Classic 70 mm e rolamentos Abec que costumo usar no domingo de manhã bem cedo quando as poucas ladeiras de Macapá ainda estão desertas e a diversão é garantida, com um pouco mais de segurança.
Além do skate sempre pratiquei esportes. Comecei a nadar aos 8 anos de idade ainda em Sorocaba – SP e participei de diversos campeonatos até alguns anos atrás quando decidi nadar somente por prazer. Em Natal fiz parte da equipe de natação do Aeroclube. Joguei basquete, tênis de mesa e também aprendi a surfar. Hoje continuo nadando regularmente, surfando apenas nas férias, pois onde moro não tem praia. Aqui tem a pororoca, mas ainda não me arrisquei. Recentemente conheci o Sérgio Laus, recordista de surf na pororoca e que também gosta e skate e estou programando uma trip para conhecer a pororoca com ele.
Quero aproveitar a oportunidade e parafraseando o Paulo, mandar para os colegas veteranos, que assim como eu, com rugas, barriga, carecas e ou cabelos brancos, ignoram as marcas do tempo com o carrinho no pé, um grande abraço e dizer que pretendo em breve me juntar a vocês para uma session aí em Natal.
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